Envelhecimento e crescimento da economia irão impactar o mutualismo nos planos de saúde médico-hospitalares
O envelhecimento da população brasileira sozinho irá gerar um crescimento de 11% da despesa assistencial per capita nos próximos dez anos. É o que mostra o estudo “Impacto do envelhecimento sobre as despesas assistenciais da Saúde Suplementar”, realizado pelo Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS). A publicação traz três diferentes cenários para estimar as implicações da mudança demográfica e do crescimento da economia na saúde suplementar.
No primeiro, foi avaliado o impacto isolado do envelhecimento, mantendo-se constantes as taxas de cobertura na população projetada pelo IBGE para cada ano. Nesse cenário, o crescimento estimado do número de beneficiários foi de 8,6% até 2031, chegando a 50,9 milhões. No total, a faixa etária de 60 anos ou mais crescerá 47,1%.
Esse cenário mostra que apenas o envelhecimento populacional é responsável por um crescimento de 20,5% das despesas assistenciais da saúde suplementar até 2031. “Mesmo considerando a despesa per capita há um crescimento relevante”, aponta José Cechin, superintendente executivo do IESS. “Nessa projeção, a despesa per capita do total de beneficiários passa de R$ 3.721 em 2020 para R$ 4.137 em 2031, crescimento de 11,2%”, reforça.
Nos demais cenários, mais realistas, além do envelhecimento, é levado em consideração o crescimento do PIB per capita. “Vale lembrar que o número de beneficiários de planos de saúde tem relação estreita com o desempenho da economia, o que se reflete na taxa de cobertura em todo o país. A forma como a economia evolui influencia o mercado de trabalho e a renda da população, que são fatores importantes na determinação da demanda por planos de saúde”, complementa o especialista.
No cenário 2, o PIB per capita cresce a 1,6% a.a. e o número de beneficiários projetado é de 62,0 milhões em 2031; no Cenário 3, a taxa do PIB per capita é 2,9% a.a. e o número de beneficiários vai a 67,6 milhões em 2031. As taxas para o PIB per capita são provenientes da Estratégia Federal de Desenvolvimento para o Brasil no período de 2020 a 2031, estabelecida por decreto em 2020.
Nos cenários 2 e 3, o crescimento da economia implica os efeitos positivos do mercado de trabalho e da renda sobre o número de beneficiários projetado. Na perspectiva do cenário 2, com crescimento do PIB per capita de 1,6% a.a., as despesas assistenciais aumentam em 50,0%. Já no cenário 3, a economia cresce 2,9% a.a. até 2031 e o número de beneficiários evolui em 42,1%, atingindo 67,6 milhões. Com isso, as despesas assistenciais crescerão 55,1%.
No cenário 3, o maior crescimento econômico aumenta a cobertura de pessoas em idade de trabalhar mais do que em pessoas com 59 anos ou mais, que em geral possuem um custo médio superior aos primeiros. Dessa forma o crescimento das despesas assistenciais do Cenário 3 ficou inferior ao do Cenário 2. Isso se refletiu na despesa per capita das projeções.
Em todos os cenários há aumento da participação da faixa etária de 60 anos ou mais nos gastos assistenciais. Em 2020, as despesas assistenciais dos beneficiários com 60 anos ou mais representavam 36,5% do total. No cenário demográfico puro elas passam a representar 45,2%, enquanto no cenário 2, passam a representar 49,1%. Já no cenário 3, a representatividade das despesas assistenciais da faixa de 60 anos ou mais foi de 45%. “Isso porque com maior crescimento econômico há ampliação da cobertura de faixas etárias mais jovens, que passam a ter maior representatividade nas despesas assistenciais”, explica o superintendente executivo do IESS.
Despesa assistencial de jovens e idosos
Em 2020, a relação entre a despesa per capita da faixa de 60 anos ou mais e da faixa dos jovens de 0 a 19 anos era de 5,9. No cenário 1, que considera apenas o efeito demográfico, essa relação passa a ser de 6,1 e nos cenários que consideram o crescimento econômico, a relação passa a ser de 6,3. Embora haja normas que regulem a diferença das mensalidades de planos de saúde entre as faixas etárias, o distanciamento da despesa dos mais idosos em relação aos mais jovens é um desafio para a sustentabilidade do setor no longo prazo.
Para José Cechin, o setor precisa estar atento para o desafio a que a saúde suplementar estará submetida nos próximos anos frente à mudança trazida pelo envelhecimento populacional no Brasil. “Será preciso um esforço grande de investimentos e desenvolvimentos para manter esse equilíbrio assistencial”, analisa. “É fundamental olharmos essa projeção com atenção e repensarmos o sistema de saúde suplementar atual”, pontua.
Ele ainda reforça que a publicação é bastante conservadora, sem levar em conta outros fatores que também pesam no aumento das despesas, questões como o avanço tecnológico ou pioras na situação de saúde da população. Parece um contrassenso considerar possíveis pioras na saúde, mas pode ser uma tendência em função de diferentes hábitos atuais: padrão alimentar baseado em produtos ultraprocessados, aumento do sedentarismo e outros.
Os cenários apontados no estudo não consideram a incorporação de novas tecnologias, a necessidade de cuidados inéditos ou ainda períodos de pandemia como da Covid-19, por exemplo. Por outro lado, igualmente não são projetadas alterações que possam reduzir os custos, como ganhos de escala ou eficiência.
De todo modo, o estudo reforça a necessidade de buscar mecanismos de aprimoramento da cadeia da saúde como um todo, modernização de modelos de pagamento de prestadores de serviços e outros aspectos. “Focar em ações de promoção da saúde é uma mudança necessária não só do ponto de vista da sustentabilidade do setor, mas principalmente para possibilitar melhor qualidade de vida para cada brasileiro e para toda a população idosa”, conclui Cechin.
Impacto do envelhecimento sobre as despesas assistenciais da saúde suplementar (2020 - 2031)
Autora: Amanda Reis
Superintendente executivo: José Cechin
O envelhecimento da população brasileira sozinho irá gerar um crescimento de 11% da despesa assistencial per capita nos próximos dez anos.
Publicação traz três diferentes cenários para estimar as implicações da mudança demográfica e do crescimento da economia na saúde suplementar.
Como é sabido e temos apontado, o Brasil e o mundo passam por uma mudança demográfica com envelhecimento da população e diferentes impactos para a saúde das pessoas e nos modelos de atenção. Exatamente por isso, divulgamos periodicamente materiais como a “Projeção das despesas assistenciais da saúde suplementar”, já analisada aqui no Blog.
Outro ponto importante nessa busca pela eficiência do sistema é buscar referências nacionais e internacionais para embasar estudos, pesquisas e fornecer subsídios para a melhor tomada de decisão no setor.
Foi com isso em mente que apresentamos o trabalho “Variação de Custos e Oportunidades de poupar em um Modelo de Cuidados Oncológicos” (Cost Variation and Savings Opportunities in the Oncology Care Model) na 24º edição do “Boletim Científico IESS”.
A publicação buscou identificar as categorias de serviços que apresentam as maiores oportunidades para reduzir os gastos em cuidados oncológicos analisando resultados do Medicare (plano de saúde público para idosos nos Estados Unidos) de 2006 a 2013. A amostra incluiu pacientes com câncer de mama avançado (estágio III ou IV), carcinoma de células renais, câncer de pulmão de não pequenas células, mieloma múltiplo ou leucemia mieloide crônica.
O estudo apontou que a quimioterapia e a internação hospitalar aguda tendem a ser os maiores contribuintes para a variação do custo nas diferentes regiões e oferecem o maior potencial para reduzir gastos.
Um trabalho semelhante foi elaborado aqui no Brasil e exposto no VIII Prêmio IESS. O pôster “Registros administrativos como fonte de dados de custos assistenciais na saúde suplementar: um estudo de caso para a colecistectomia em hospitais do Rio Grande do Sul”, apresentado por Marcia Regina Godoy e Giacomo Balbinotto Neto, mostrou como o procedimento pode variar de custo dentro do próprio Estado. Nós falamos melhor do estudo aqui e você também pode conferir o resumo dos pôsteres nos Anais do VIII Prêmio IESS.
“Envelhecimento populacional” é o tema do próximo especial aqui do Blog. A enquete que abrimos no dia 24 de outubro ficou aberta para votação até 14 de novembro às 17h e recebeu 372 votos.
O tema vencedor, “Envelhecimento populacional”, recebeu 109 votos. Apenas 19 a mais que o segundo colocado, “Desafios para a sustentabilidade da saúde suplementar”, que teve 91 votos.
Para nós é importante constatar que mesmo com a frequência que mencionamos o assunto em nosso blog, exatamente por considerá-lo fundamental para a sustentabilidade do setor e a qualidade de vida dos brasileiros, você ainda o escolheu como tema de nosso próximo especial. Sinal de que estamos alinhados.
Nas próximas semanas iremos preparar os conteúdos para este especial e avisar a data em que ele será publicado. Obrigado por nos acompanhar e participar desta votação.
Confira abaixo o resultado completo da enquete:
Total – 372
Envelhecimento populacional – 109
Desafios para a sustentabilidade da saúde suplementar – 91
Promoção da saúde – 67
Aplicação de TI no mercado de saúde suplementar – 55
Judicialização da saúde – 49
Outros – 2 votos
Debate "Desafios e perspectivas para o Brasil frente ao envelhecimento" - parte 1
Debate "Desafios e perspectivas para o Brasil frente ao envelhecimento" - parte 4
Segunda (27/6), aqui no Blog, apresentamos um estudo sobre os impactos do envelhecimento da população brasileira na saúde suplementar e como o fim do bônus demográfico pode representar um risco, mas, também, uma oportunidade para o setor.
O fato é que a projeção acende uma luz amarela para os gestores do sistema de saúde. Indicando sobretudo a necessidade de redimensionamento da rede de atendimento. De acordo com o TD 57 – “Atualização das projeções para a saúde suplementar de gastos com saúde: envelhecimento populacional e os desafios para o sistema de saúde brasileiro” –, o envelhecimento da população deve mais que dobrar a quantidade de internações de beneficiários com 59 anos ou mais. Isso significa que, apenas para essa faixa etária, o total de internações irá saltar de 2 milhões, em 2014, para 4,1 milhões em 2030. Incremento de 105%.
A projeção, mesmo analisada isoladamente, preocupa. Até porque, esse é o grupo de beneficiários com maior prevalência de doenças crônicas (como diabetes e hipertensão arterial), que demandam mais atenção, recursos e, consequentemente, mais gastos. Soma-se aí, ainda, um aumento de mais de 100% em todos os grandes grupos de procedimentos: o total de consultas deve saltar de 43,1 milhões para 86,6 milhões; o número de terapias irá aumentar de 25,6 milhões para 51,8 milhões; e a quantidade de exames irá avançar de 204 milhões para 411,8 milhões.
Frente a este cenário, ganha peso, também, dar atenção às ações de promoção da saúde. Mudança necessária não só do ponto de vista da sustentabilidade do setor, mas, principalmente, para que a população tenha mais qualidade de vida para aproveitar esse aumento da longevidade. O estudo “Promoção da Saúde nas Empresas”, produzido para nós pelos especialistas Alberto Ogata e Michael O’Donnell, indica caminhos e ferramentas para o aprimoramento de ações nesse sentido.
O TD 57 ainda traz as projeções de crescimento do total de beneficiários, dos custos assistenciais (que devem quase quadruplicar) e de utilização da rede pelas demais faixas etárias. Vamos continuar nesse assunto em outros posts.
Desde 2012, temos estudado quais serão os impactos do envelhecimento da população no Brasil no sistema de saúde e, de uma forma mais particular, na saúde suplementar. Fica cada vez mais claro que, se houver planejamento e adoção de medidas corretas, o ciclo de mudança demográfica do Brasil vai representar uma imensa oportunidade para a saúde suplementar evoluir. Dito de outra forma, não encarar essa transformação com as devidas reformas estruturais, novas práticas de gestão e um novo jeito de enxergar a assistência à saúde pode, na prática, representar um risco imenso para o futuro desse setor.
A grande novidade do nosso estudo, este ano, é a aferição do total de procedimentos realizados e a projeção de quanto eles serão demandados até 2030, com o termino do bônus demográfico.
De acordo com o trabalho inédito do IESS, o total de internações de beneficiários de planos de saúde médico-hospitalares com 59 anos ou mais vai crescer 105% até 2030, chegando a 4,1 milhões ao ano. Os dados do TD 57 – “Atualização das projeções para a saúde suplementar de gastos com saúde: envelhecimento populacional e os desafios para o sistema de saúde brasileiro” – alertam para a necessidade redimensionar a rede de atendimento e desenvolver ações focadas em promoção da saúde.
Destaque-se o aumento de internações para os beneficiários com 59 anos ou mais não é um fato isolado. O total de consultas, terapias e exames de beneficiários nessa faixa etária vai mais do que dobrar no período analisado. E isso é só a ponta do iceberg. O estudo aponta o crescimento da utilização desses procedimentos, embora em ritmo menor, também para os beneficiários com idade entre 19 e 58 anos.
O estudo ainda aponta que, até 2030, os planos de saúde devem contar com 59,4 milhões de vínculos e os gastos assistenciais das operadoras chegariam R$ 396,4 bilhões. Um avanço de 272,9% em comparação a 2014. A mudança, por si só, pode representar um risco para o setor, que precisará se modernizar para garantir sua sustentabilidade.
Como o rol de cobertura e procedimentos exigido das operadoras pela ANS é bastante rigoroso e o mesmo vale para a o dimensionamento da rede de cobertura, será preciso um esforço grande de investimentos para manter esse equilíbrio assistencial. Esses investimentos podem e devem ser induzidos pelas operadoras, governo e, principalmente, pelos prestadores de serviços de saúde no Brasil. Mas, por outro lado, despontam como um enorme polo de atratividade para novos interessados em investir no setor.
O estudo é amplo e motiva reflexões necessárias para entendermos como o envelhecimento populacional vai ser determinante para os rumos do setor. Questões que vamos explorar nos próximos dias. Já que, certamente, há como transformar os riscos em oportunidades.
A Lei 9.656/1999, que rege a saúde suplementar, estabelece dois tipos de reajustes das mensalidades: o anual, por variação dos custos; e em virtude da mudança de faixa etária do beneficiário. É sobre esta segunda modalidade de reajuste que vamos conversar.
O aniversário de 59 anos é um marco importante para o beneficiário. É nesse momento que o relacionamento entre ele e as operadoras costuma passar por uma grande tensão. O Estatuto do Idoso, de outubro de 2003, estabelece uma rede de proteção ao cidadão a partir de 60 anos, considerada a terceira idade.
No caso da saúde suplementar, a regulamentação disciplina ser proibido a “discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”. Assim, os reajustes anuais só podem ser feitos conforme a regra por tipo de contratação: limite máximo de reajuste definido pela ANS para os planos individuais; por agrupamento, para planos até 29 beneficiários; livre negociação entre operadora e contratantes para os planos coletivos empresariais e por adesão.
Também a regulamentação dos planos determina que a última faixa etária de precificação, de 59 anos ou mais, pode custar, no máximo, até seis vezes o valor da primeira faixa (0 a 18 anos) para um mesmo produto. Logo, não importa se o beneficiário possui 59 ou 90 anos, o valor é o mesmo, e a mensalidade passa a ser corrigida conforme os critérios previstos no contrato ou normas da ANS.
Nos últimos dias, vimos uma série de manifestações na imprensa dando conta que os planos dos idosos são os que mais crescem em seus valores e que há abusividade. Há que se olhar essas expressões com algum cuidado.
As regras dos reajustes dos idosos são extremamente claras. Evidentemente que a mudança de faixa etária para os 59 anos resulta em um impacto significativo nos valores das mensalidades. Por outro lado, depois dos 59 anos, não há mais correção por idade.
Como preservar, então, a capacidade de uma operadora honrar com a assistência, se não há adequada precificação conforme a faixa etária? E, ao mesmo tempo, como garantir que o beneficiário consiga manter o plano diante desses reajustes? Essa é uma conta difícil de fechar.
Ultimamente, o processo de envelhecimento populacional do Brasil tem aberto diversos debates a respeito do gerenciamento da saúde dos idosos e como preservar a capacidade financeira para a terceira idade manter os planos, assim como de que forma as operadoras podem ter seus custos cobertos pelos valores das mensalidades.
A agenda sugere que se avance no projeto VGBL Saúde, exatamente para equilibrar as questões financeiras em longo prazo. Outro ponto de discussão é se, de fato, o plano não deveria ser precificado por faixa etária também para os idosos. O tema é polêmico, mas, tecnicamente, não deveria ser encarado como “discriminação”, e sim como “equilíbrio de custos e receitas”. Há um subsídio indireto e intergeracional no modelo atual de precificação, em que os mais jovens, que geram menos custos, assumem uma parte dos custos dos mais velhos. Talvez o debate que possa ser feito não poderia ser: cada faixa etária deve ser precificada proporcionalmente aos custos que gera? E isso seria efetivamente discriminação?
Por fim, o debate maduro também sugere repensar sobre o Estatuto do Idoso. Ninguém em sã consciência pode ser contra a essa rede de proteção aos mais velhos. Mas, o que se pode discutir, efetivamente, é que a evolução da qualidade de vida, a promoção da saúde e a tecnologia contribuíram muito para a longevidade das pessoas. O “idoso” de 60 anos de hoje não equivale a quem possuía 50 anos há uma ou duas décadas? Esse é o debate que se desenvolve, por exemplo, na Previdência Social. E, com maturidade e respeito, principalmente ao idoso, também deveria ser desenvolvido na saúde suplementar.