Melhorar a segurança do paciente e a qualidade da assistência prestada é ordem do dia para garantir o futuro dos sistemas de saúde e, ao mesmo tempo, definir estratégias para a redução dos custos, desperdícios e práticas abusivas em toda a cadeia.
É com esse objetivo que realizamos recentemente o Seminário Internacional “Qualidade Assistencial e Segurança do Paciente em Serviços de Saúde” com o lançamento do 2° Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar no Brasil, produzido pelo IESS e pelo Instituto de Pesquisa Feluma, da Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais, além de apresentações de palestrantes nacionais e internacionais com informações e casos bem sucedidos na melhoria da transparência e, consequentemente, na qualidade dos serviços prestados.
Tarefas fundamentais na construção dessas estratégias são definir, identificar e reduzir gastos desnecessários dos serviços de saúde. Acreditamos que cada elo da cadeia de saúde pode, e deve, contribuir com a utilização mais eficiente dos recursos. A questão da alta dos custos é um problema central dos setores de saúde em âmbito global e parte da busca por melhores práticas que passa pelo fornecimento de informações à sociedade e aos agentes envolvidos no segmento.
Como já abordamos aqui, há uma série de iniciativas a respeito em âmbito global, como o movimento internacional Choosing Wisely, que levantou cerca de 200 procedimentos em saúde de benefício questionável para o paciente (foram exames, procedimentos e intervenções médicas em várias áreas da saúde), contribuindo para a ampliação do debate da superutilização dos serviços de saúde.
No entanto, o sucesso desses programas, e de outros semelhantes, depende da capacidade de medir com precisão o uso excessivo dos serviços de saúde. Uma ferramenta que pode capturar informações clínicas mais detalhadas e o contexto por uso inadequado é o Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP). Foi exatamente essa a intenção do trabalho “Measuring Overuse With Electronic Health Records Data” (Medindo o uso excessivo com dados do Prontuário Eletrônico do Paciente), publicado na 22º edição do Boletim Científico que explorou as tendências de uso excessivo para cada serviço de baixo valor entre 2011 e 2013 usando a regressão logística. O estudo foi realizado no Atrius Health, um grupo de assistência médica que oferece cuidados primários e especializados para mais de 740.000 pacientes no leste do Estado de Massachusetts (Estados Unidos).
A pesquisa mostrou que, em 2013, a prevalência de uso excessivo variou de 0,2% (proporção de exame de Papanicolau em mulheres de 18 a 21 anos) a 57% (proporção de exames de densitometria óssea realizados em mulheres de 18 a 65 anos). Entre as 12 medidas analisadas no período, 8 serviços demonstraram uma diminuição estatisticamente significativa no uso excessivo, enquanto 1 aumentou significativamente.
Portanto, a utilização do PEP auxilia na precisão e confiabilidade da aferição dos serviços clínicos e os fatores de risco que podem desencadear ou explicar o uso de testes e exames de baixo valor. Como mostramos aqui, a maior proteção de dados em âmbito nacional deve auxiliar na disseminação no país do Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP), que já apresentamos os benefícios no TD “Prontuário Eletrônico do Paciente e os benefícios para o avanço da saúde”.
A ampliação do uso deve ser um passo primordial para garantir mais celeridade nas relações, otimizar o tempo dos profissionais e representar ganho de eficiência operacional e melhoria das diferentes formas de assistência ao paciente, com maior controle de agendamentos de consultas, estoques de medicamentos, disponibilidade de vagas, escalas médicas e outros.
Lançado esta semana durante o Seminário Internacional “Qualidade Assistencial e Segurança do Paciente em Serviços de Saúde”, o 2° Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar no Brasil, produzido pelo IESS e pelo Instituto de Pesquisa Feluma, da Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais traz números alarmantes acerca da assistência em saúde no Brasil.
Nós já falamos aqui no Blog que a publicação mostra que os hospitais públicos e privados do Brasil registraram, em 2017, seis mortes, a cada hora, decorrentes dos chamados “eventos adversos graves”, ocasionados por erros, falhas assistenciais ou processuais ou infecções, entre outros fatores. Outro fator importante apontado pela publicação é que esses eventos consumiram R$ 10,6 bilhões apenas do sistema privado de saúde no período analisado.
Além das vidas perdidas por eventos adversos e dos pacientes que tiveram sua recuperação ou sua qualidade de vida afetada, esse problema ainda determina um elevado impacto em leitos-dia para o sistema de saúde brasileiro, uma vez que essas situações também refletem no tempo de recuperação dos pacientes. Impedindo que mais pacientes sejam atendidos.
De acordo com o estudo, cada evento adverso grave determina a extensão do período de internação em média em 14,4 dias (16,4 dias para pacientes no SUS e 10,5 dias para pacientes na rede privada).
Com isso, ao longo de 2017, foram consumidos 14,3 milhões de leitos-dia em função de eventos adversos. Sendo 4,7 milhões em razão de eventos adversos graves. O estudo mostra que o tempo de internação entre os pacientes que não passaram por evento adverso é de 6 dias para o SUS e 3,5 dias para a rede privada. Portanto, seria possível atender aproximadamente mais 7,7 milhões de pacientes (2,9 milhões relacionados a eventos adversos gerais e mais 4,7 milhões relacionados a eventos adversos graves) sem aumentar os gastos ou ampliar a rede.
Contando com 165,9 milhões de leitos-dia em 2017, o país utilizou apenas 96,6 milhões, ou seja, uma ociosidade de 41,8%. Sendo assim, é importante que o sistema esteja focado nas internações em centros de excelência maiores para racionalizar os recursos, reduzir custos e concentrar profissionais qualificados em ambientes com maior controle de processos, ao invés de distribuir leitos por todas as cidades. Isso certamente contribui para a diminuição da ocorrência de eventos adversos.
O 2° Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar no Brasil foi calculado com base em uma amostra de 456.396 pacientes internados em hospitais da rede pública e privada ao longo de 2017. Os dados foram coletados junto a instituições localizadas em municípios de grande porte e com IDH acima da média nacional. Com isso, é possível que os números nacionais sejam maiores do que os encontrados.
Confira a publicação na íntegra.
Realizamos ontem, em São Paulo, o Seminário Internacional - Qualidade Assistencial e Segurança do Paciente em Serviços de Saúde com o objetivo de debater as mudanças necessárias para a saúde frente aos crescentes desafios do setor sobre a qualidade da assistência com especialistas nacionais e internacionais.
Durante o evento, apresentamos os resultados do 2° Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar no Brasil, produzido pelo IESS e pelo Instituto de Pesquisa Feluma, da Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais. Como apontamos aqui, o Anuário tem o objetivo de mensurar os problemas assistenciais e gerenciais hoje vividos pelas estruturas de saúde do Brasil para sugerir medidas de aperfeiçoamento do sistema. Considerando todo o sistema hospitalar do País, 54,76 mil mortes foram causadas pelos eventos adversos graves, sendo que 36,17 mil poderiam ter sido evitadas.
As vidas perdidas, sem dúvida, são o principal motivo para combater os eventos adversos. Contudo, o Anuário projeta que esses eventos consumiram R$ 10,6 bilhões apenas do sistema privado de saúde. Não foi possível estimar as perdas para o SUS porque os valores pagos aos hospitais se originam das Autorizações de Internações Hospitalares (AIHs) e são fixados nas contratualizações, existindo outras fontes de receita não operacionais, com enorme variação em todo o Brasil.
Um dos principais determinantes para esse desperdício é o modelo de remuneração de prestadores de serviço adotado no País, o fee-for-service. Esse modelo acaba premiando o desperdício, já que as organizações inseguras, com maior incidência de eventos adversos e que apresentam piores índices de recuperação da saúde dos pacientes, são recompensadas com um aumento das receitas pelo retrabalho. Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos, desde 2008, o governo não paga pelos gastos decorrentes de 14 tipos de eventos adversos.
O Anuário aponta que uma das principais dificuldades estruturais para essa mudança está nas regras que regem o sistema de saúde suplementar. A norma definida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) restringe o descredenciamento de prestadores, exigindo substituição equivalente ou superior, inibindo a concorrência. Como não há indicadores de qualidade e transparência no setor, até mesmo esse critério pode ser aperfeiçoado a partir da publicidade dessas informações.
O 2° Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar no Brasil foi calculado com base em uma amostra de 456.396 pacientes internados em hospitais da rede pública e privada ao longo de 2017. Os dados foram coletados junto a instituições localizadas em municípios de grande porte e com IDH acima da média nacional. Com isso, é possível que os números nacionais sejam maiores do que os encontrados.
Para saber mais sobre outros modelos de pagamento, conheça nossa área temática. Confira o do 2° Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar no Brasil na íntegra e continue acompanhando nossas publicações.
As operadoras de planos de saúde devem gastar R$ 383,5 bilhões com assistência de seus beneficiários em 2030. O montante representa um avanço de 157,3% em relação ao registrado em 2017 e acende uma luz de alerta para o setor, segundo a “Projeção das despesas assistenciais da saúde suplementar”, que estamos divulgando hoje.
Para manter a sustentabilidade econômico-financeira do setor, acreditamos que todos os envolvidos nessa cadeia precisam repensar questões como o modelo de remuneração de prestadores de serviço, a falta de transparência e o desperdício gerado por erros, fraudes e eventos adversos, além da inclusão de novos produtos na saúde suplementar. Especialmente porque a projeção de aumento de despesas assistenciais que realizamos é bastante conservadora, sem levar em conta questões como o avanço tecnológico ou pioras na situação de saúde da população, o que tende a acontecer com o envelhecimento.
De acordo com o levantamento, considerando uma taxa de cobertura constante, o efeito do crescimento populacional e a mudança na composição etária da sociedade brasileira, o setor de saúde suplementar deve firmar mais 4,3 milhões de vínculos até 2030. O que elevaria o total de beneficiários para 51,6 milhões. Considerando apenas o aumento do total de vínculos com planos de saúde médico-hospitalares e o avanço do porcentual dos beneficiários com 59 anos ou mais, as despesas assistenciais de 2030 já subiriam para R$ 190,7 bilhões. Um aumento de 27,9%.
Contudo, o principal determinante para essa conta é a variação dos custos médico-hospitalares (VCMH), que tem crescido sistematicamente acima da inflação geral. Em 2016, por exemplo, a inflação medida pelo IPCA foi de 6,3%, enquanto a variação dos custos médico-hospitalares avançou 20,4%, de acordo com o VCMH/IESS.
Nos próximos dias iremos analisar, aqui no Blog, a composição das despesas por faixa etária e os números de utilização de procedimentos indicados em nossa projeção. Não perca!
Em matéria publicada na última semana, o Jornal Folha de Pernambuco tocou num importante tema para a saúde e algo que falamos periodicamente. Os gastos com saúde em todo o país e os diferentes motivos que elevam esses valores. Logo no início da matéria, o jornal reforça a pesquisa IESS/Ibope que mostra que o plano de saúde é o terceiro maior desejo da população, atrás da casa própria e de educação. O principal empecilho, apontado por 78% dos não beneficiários, é justamente o custo do plano.
Aqui vale uma ressalva: a matéria aponta que a saúde suplementar arrecadou R$ 161 bilhões para atender 23% da população brasileira, ou 47,4 milhões de beneficiários. Cabe lembrar, no entanto, como são empregados os recursos advindos do valor pago aos planos de saúde. Como pode ser visto aqui, de cada R$ 100 pago às operadoras, R$ 85,58 são gastos assistenciais com serviços médicos, R$ 11,31 são destinados para o pagamento de despesas administrativas (como tributos) e apenas R$ 3,11 ficam de resultado. Sendo que o valor médio das mensalidades dos planos em dezembro de 2016 (o dado mais recente disponível) foi de R$277,01 para os planos médico-hospitalares.
A publicação mostra alguns dos motivos que alavancam os gastos com saúde em todo o país, como a adoção de novas tecnologias, o processo de mudança demográfica com o envelhecimento da população e o modelo de pagamento mais recorrente no país, o fee for service (FFS), que privilegia a quantidade de atendimentos e não a qualidade e incentiva a maior utilização de procedimentos e insumos, gerando mais desperdício em toda a cadeia. Como já apontamos aqui, aproximadamente 19% dos gastos assistenciais da saúde suplementar no país são consumidos por desperdícios e fraudes. Algo na casa dos R$25,5 bilhões no ano de 2016, somando contas hospitalares e de exames.
A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) faz coro com nossas pesquisas e levantamentos sobre o impacto desses fenômenos nos custos com saúde no Brasil e ainda lança um alerta para a população. “A Abramge entende que a sociedade deve participar mais ativamente desta discussão com questionamentos como: ‘É realmente necessário determinado procedimento, sendo que existe outro similar mais barato? Estou disposto a arcar com os aumentos em virtude dessas novas tecnologias?’”, afirma.
Ainda há um longo caminho a ser percorrido para garantir a sustentabilidade do setor e uma série de medidas devem ser tomadas para isso. Algo importante nessa jornada é o empoderamento do paciente, com mais informações e ferramentas para gerenciar melhor a sua saúde, seja sobre a incorporação de novas tecnologias ou ainda no uso dos diferentes procedimentos.
Ontem apresentamos, aqui, a sugestão da OCDE de o governo “acabar com a dedutibilidade fiscal dos gastos com planos de saúde”. Claro, como também explicamos, uma vez que os gastos com saúde (uma necessidade básica, segundo a Constituição) representam um decréscimo patrimonial, não cabe falar em renúncia fiscal do governo.
Apesar de entendermos que o assunto já está claro, tanto pelo exposto ontem quanto pelos artigos e estudos que publicamos nos últimos anos, consideramos importante explicar outros erros relacionados ao assunto cometidos no relatório da entidade.
Especialmente quando este afirma que “a dedutibilidade fiscal das contribuições a planos de saúde privados feitas por 25% dos brasileiros e seus empregadores tem efeitos regressivos e poderia ser suprimido, economizando 0,3% do PIB”.
Primeiramente, é fundamental destacar que entre os brasileiros que têm plano de saúde médico-hospitalar (aproximadamente 25% da população), apenas uma pequena fração consegue aproveitar seu direito constitucional e deduzir as perdas patrimoniais advindas dos gastos com saúde no Imposto de Renda (IR). Isso porque, só tem decréscimo patrimonial o beneficiário que pagou total ou parcialmente pela mensalidade do plano, o que já exclui mais da metade dos beneficiários que têm o plano pago por suas empresas. Além disso, para abater os gastos com saúde no IR é necessário optar pela declaração completa ao invés da simplificada. Logo, ainda que houvesse renúncia, ela atingiria uma parcela muito baixa da população.
Outro ponto: afirmar que seria economizado “0,3% do PIB” nos parece uma análise extremamente superficial. Para chegar a esse número, fora considerar que um quarto da população está efetivamente se valendo de um direito constitucional como se fosse uma benesse do governo e não um direito, a OCDE também desconsidera o alívio que a saúde suplementar traz ao SUS. Tanto em capacidade assistencial, quanto em gastos do cofre público.
Afinal, as OPS, bem como outros elos da cadeia produtiva da saúde, são expressivas fontes geradoras de receitas ao erário. Um trabalho produzido pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), a pedido da Abramge, identificou que a saúde suplementar recolheu, diretamente, R$ 4,3 bilhões em tributos, em 2013. Outros R$ 19 bilhões adicionais vieram de tributação indireta, projeta o estudo.
Ademais, conforme dados da sala de situação da ANS, até o 3° trimestre de 2017 as OPS desembolsaram cerca de R$ 110,5 bilhões em despesas assistenciais. Um montante que, mesmo sem considerarmos os tributos diretos gerados e o ressarcimento ao SUS, o governo não teria como desembolsar para absorver com a mesma qualidade assistencial os beneficiários de planos de saúde médico-hospitalares ao SUS.
Apesar de os números estarem um pouco antigos, vale lembrar um levantamento que fizemos entre 2009 e 2012. No período, a soma das despesas assistenciais das operadoras com beneficiários totalizou mais de R$ 263 bilhões. Somando mais R$ 12,2 bilhões recolhidos em tributos diretos e R$ 180 milhões pagos de ressarcimento ao SUS, chegaríamos a um total de R$ 275,3 bilhões. Já as deduções fiscais das pessoas físicas e jurídicas com planos de saúde somaram R$ 30,2 bilhões. Ou seja, para cada R$ 1 que o Estado teria abdicado de arrecadação (novamente, se houve renúncia fiscal ao invés de um direito constitucional), recebeu R$ 9,11 da saúde suplementar.
Nos parece uma ótima economia. Na verdade, a ideia é tão boa que há países que efetivamente oferecem incentivos fiscais para que as pessoas contem com saúde privada ao invés da pública, como já mostramos aqui no blog. É uma iniciativa de “ganha-ganha” que já passou da hora de considerarmos por aqui.
Se você quer saber mais sobre o assunto, não perca, na sexta (23/03) nosso blog com a palestra (em vídeo) do advogado especialista em tributação Ricardo Lodi.
Todos sabemos quanto e como a crise econômica atingiu o País nos últimos anos. A redução do mercado formal de empregos e da renda das famílias foi determinante para o rompimento de mais de três milhões de vínculos com planos de saúde médico-hospitalares desde dezembro de 2014; apesar da resistência das famílias em deixar o plano, como já mostramos aqui no blog.
Nos últimos meses, contudo, temos visto o início de um processo de recuperação econômica e, possivelmente, de retomada de crescimento do número de beneficiários de planos de saúde – considerando as bases de dados com a série histórica de beneficiários disponíveis da ANS, a alta de 0,2% no total de vínculos a planos médico-hospitalares entre janeiro de 2018 e o mesmo mês de 2017, ainda que bastante modesta, é a primeira variação positiva com base em 12 meses registrada desde junho de 2015, como também mostramos aqui.
Pensando em auxiliar a retomada da economia brasileira, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) produziu um relatório no qual elenca uma série de medidas que o governo deveria tomar para assegurar o cumprimento do teto de gastos e a sustentabilidade das contas públicas. Por exemplo, a reforma na Previdência.
O problema, nos atendo a nossa área de expertise, está na avaliação da entidade em relação aos gastos públicos com saúde e a sugestão de que o governo deveria “acabar com a dedutibilidade fiscal dos gastos com planos de saúde”, uma vez que, segundo o documento, “a dedutibilidade fiscal das contribuições a planos de saúde privados feitas por 25% dos brasileiros e seus empregadores tem efeitos regressivos e poderia ser suprimido, economizando 0,3% do PIB”. Ora, como o artigo “O fim do mito da desoneração fiscal da saúde suplementar” e o O TD 58 – "Deduções fiscais das despesas com saúde do Imposto de Renda: análise focada nos planos de saúde” mostram muito claramente, o governo não promove renúncia fiscal.
Isso porque o Imposto de Renda (IR) incide sobre acréscimos patrimoniais dos contribuintes, conforme determina o Código Tributário Brasileiro. Como, na prática, toda vez que o contribuinte paga por um serviço de saúde privado, visando suprir suas necessidades básicas de existência, sofre um decréscimo patrimonial – lógico, porque se trata de um recurso financeiro do qual se abriu mão do consumo ou do aumento de patrimônio para cumprir o que seria uma responsabilidade constitucional do Estado –, é natural (e definido por Lei) que esse valor seja abatido do calculo do IR.
O assunto, claro, é complexo. Por isso, voltaremos ao tema ainda esta semana, inclusive com uma palestra (em vídeo) do advogado especialista em tributação Ricardo Lodi. Não perca.
Será que é possível reduzir gastos no setor de saúde suplementar sem diminuir a qualidade? O estudo “Association Between Hospital Participation in a Medicare Bundled Payment Initiative and Payments and Quality Outcomes for Lower Extremity Joint Replacement Episodes", publicado na 15ª edição do Boletim Científico com o título “Associação entre a participação de hospitais em uma iniciativa do Medicare de pagamento por pacote (Bundled payment) e os resultados de qualidade para episódios de implante de prótese de articulação” , avalia o programa Bundled Payments for Care Improvement (BPCI), dos Estados Unidos, e garante que sim, é possível.
De acordo com o estudo, foi possível observar que nos hospitais que participaram do programa BPCI os gastos caíram, em média, U$ 1.166 a mais do que no grupo de comparação que não participava do programa. Isso sem alterar a qualidade da assistência prestada entre os hospitais analisados.
Na realidade, entrevistas com os pacientes dos dois grupos mostraram que os que realizaram implante de prótese de articulações (principalmente joelho e quadril) nos hospitais participantes do BPCI apresentaram resultados mais expressivos, como melhorias na mobilidade, menores problemas físicos e emocionais e menos dor no período de recuperação.
Um forte indicador de que programas de controle de gasto com foco em eficiência acabam por beneficiar o atendimento dos pacientes.
Um dos assuntos mais abordados aqui no Blog é o desperdício na saúde suplementar, um dos principais motivos para os elevados custos do setor de saúde suplementar. Por tanto, quando um médico assume um dos principais hospitais do País e afirma que “caro é o desperdício, cara é a ineficiência, a complicação, a readmissão (hospitalar). Tudo isso torna a saúde cara", não podemos deixar de ecoar suas preocupações.
A declaração foi feita pelo cirurgião Sidney Klajner, novo presidente do Hospital Israelita Albert Einstein, em entrevista à Folha de S.Paulo e reflete bem o que defendemos há tempo.
Apenas para contextualizar o que estamos falando, eventos adversos em saúde consomem até R$ 15 bilhões da saúde privada no Brasil por ano. Como apontamos no Estudo “Erros acontecem: a força da transparência no enfretamento dos eventos adversos assistenciais em pacientes hospitalizados” (leia mais aqui). Na conta estão inclusos gastos com medicação aplicada em dosagem errada ou na dosagem correta mas com o medicamento errado, falhas no atendimento que levaram a readmissão de pacientes e muitos outros problemas que poderiam ser evitados.
Ainda faltam computar outros desperdícios, como exames realizados duas vezes, exames realizados mas não retirados, gastos com materiais e exames não necessários etc. O excesso de equipamentos, como aparelhos de ressonância magnética (já comentado aqui no Blog) e mamógrafos (também já apresentado aqui), de manutenção cara e normalmente sub ou super utilizados é outra fonte de desperdício. O TD 51: “PIB estadual e Saúde: riqueza regional relacionada à disponibilidade de equipamentos e serviços de saúde para setor da saúde suplementar” faz uma radiografia dessa questão.
A origem do problema está, contudo, diretamente relacionada ao modelo de pagamento ainda adotado no Brasil: o regime de "conta aberta" (fee for service). Com ele, o hospital é incentivado a consumir o máximo de insumos possíveis para fazer a conta crescer e, assim, aplicar suas taxas sobre todo o consumo. Há um estímulo ao uso dos insumos mais caros e a conta é paga pelo plano, incorporando os desperdícios. O que torna ainda mais importante o comentário do novo presidente do Hospital Israelita Albert Einstein.
Vale ainda destacar que o estudo "A cadeia da saúde suplementar", produzido pelo Insper a nosso pedido, demonstra que as falhas de mercado, como competição imperfeita, oligopólio diferenciado, assimetria de informação e corrupção – que alavancam os custos de OPMEs, como mostra o TD 55: "Distorções nos gastos com OPME" –,combinadas ao atual modelo de remuneração dos prestadores, criam as condições perfeitas para potencializar os custos de saúde no País. Portanto, ou o mercado muda o modelo de pagamento, premiando a eficiência e punindo o desperdício, ou o sistema continuará registrando recordes de custos.