Em 28 de fevereiro, aqui no blog, anunciamos que estávamos terminando um estudo que iria apontar quanto o Governo economiza para cada R$ 1 de gasto tributário. Hoje, pagamos a dívida com o TD 77 – “Gasto tributário como ferramenta para o desenvolvimento econômico e social do País” (LINK).
De acordo com o trabalho, o gasto per capita do governo com o Sistema Único de Saúde (SUS) foi de R$ 1.742,83 em 2018 (últimos dados disponíveis). No mesmo ano, as deduções fiscais per capita por beneficiário de plano de saúde foram de R$ 442,32. Ou seja, o governo teve uma economia de R$ 1.300,51 para cada beneficiário que deixa de ir ao SUS para utilizar serviço privado.
O gasto tributário com saúde é uma política também adotada em outros países (como comentamos no dia 28 de fevereiro e em outras oportunidades) que se justifica no Brasil pela enorme dificuldade que o Estado tem de aplicar recursos suficientes para um atendimento adequado a todos os brasileiros. Ou seja, repensar a política de deduções fiscais para estimular a contratação de planos de saúde, tanto por pessoas físicas quanto jurídicas, poderia trazer um alívio no atendimento dos serviços de saúde públicos. Isso porque parte das pessoas migrariam para a saúde suplementar, aliviando o orçamento do SUS e suas filas.
O levantamento do IESS projeta gastos tributários de R$ 306,4 bilhões em 2019, o que representa 4,1% do PIB e 21% das receitas. Desses, 13,5% ou R$41,3 bilhões seriam destinados à saúde. Vale destacar que não há incentivo direto para as operadoras de planos e seguros de saúde. Esses são feitos às pessoas físicas que declaram seu imposto de renda no modelo completo e pessoas jurídicas contratantes de planos e seguros de saúde que têm os custos com o plano de seus colaboradores legalmente incorporadas nas suas despesas operacionais.
O estudo ainda lembra que as despesas com planos de saúde representam, em média, 13,1% da folha de pagamento das grandes empresas. O fim da dedução, portanto, poderia ter um alto impacto para as empresas, possivelmente inviabilizando a oferta do benefício a muitos de seus colaboradores e, consequentemente, o aumento da procura pelo SUS.
Entenda a função dos gastos tributários
A Receita Federal do Brasil explica, em relatório, que os gastos tributários têm como objetivo o desenvolvimento econômico e social do País. A metodologia dos gastos tributários foi disseminada na década de 1960 e chegou ao Brasil na década de 1980, o que colaborou para que fosse estabelecida na Constituição Federal. O Governo pode incentivar o crescimento econômico ou social por meio de gasto tributário com a isenção ou redução de impostos tanto para o contribuinte pessoa física quanto para empresas.
Burocracia em excesso
Além da política de gasto tributário, o TD 77 destaca que as empresas gastam, em média, 1.958 horas e R$ 60 bilhões por ano de burocracia apenas para o cumprimento do regime tributário vigente, sem contar o peso da carga tributária propriamente dita. Apesar disso, a sociedade ainda encontra dificuldades de acesso aos serviços públicos. O que explicita a necessidade de se debater uma ampla reforma tributária no País.
O Brasil encerrou 2010 com saldo positivo de 2,2 milhões de empregos formais e se manteve “no azul” até 2014. No entanto, nos 3 anos seguintes, de 2015 a 2017, a economia entrou em estagnação e, depois, em recessão. Resultando em desemprego para mais de 13 milhões de pessoas. Apenas em 2017, foram encerrados 11,9 mil postos de trabalhos formais. Os dados integram o Relatório de Conta Satélite de Saúde, divulgado este mês pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O documento destaca que no 1° trimestre de 2017 a taxa de desocupação atingiu o recorde histórico de 13,7%. Naquele ano, a economia como um todo registrou retração de 0,3% no total de postos de trabalho. Contudo, como mostra nosso relatório de emprego na cadeia produtiva da saúde, o total de vagas formais no setor cresceu 3,4%.
A publicação também aponta que o sistema de saúde figura como importante parte da economia brasileira, sendo que as despesas com essa área representaram 9,2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2017, com o setor privado respondendo por 55% desse total e o público por 45%. Os números mais atuais podem ser conferidos aqui.
Gastos totais em saúde do público e privado em 2017 (%)
Fonte: IBGE Elaboração: IESS
Outro indicativo importante a ser considerado é o de valor adicionado bruto (medida de geração de renda em cada atividade econômica). Em 2010, as atividades de saúde responderam por R$ 202,3 bilhões, o que representa 6,1% no total da economia. Já em 2017, esse total avançou para R$ 429, 2 bilhões, o que equivale a 7,6% do total da economia naquele ano. A principal responsável por este aumento foi a atividade de saúde privada, que passou de 2,1% do valor adicionado bruto total da economia, em 2010, para 3% em 2017.
No período de 2010 a 2017, a participação das despesas de saúde no PIB aumentou de 8,0% para 9,2%. Ou seja, cresceram mesmo em um período de recessão da economia, como pode ser notado no gráfico abaixo.
Entre 2014 e 2016, a variação em volume do consumo final de bens e serviços de saúde das famílias superou a de bens e serviços “não saúde”, indicando claramente que, na crise, as famílias reduziram o consumo de outros itens para manter seus cuidados com a saúde, especialmente os planos médico-hospitalares. Este comportamento também foi identificado na última edição da pesquisa IBOPE/IESS, que aponta o plano de saúde como o 3° item mais desejado pelos brasileiros, após educação e casa própria.
Em 2017, 66,8% do total das despesas das famílias com saúde se destinaram para pagar serviços privados, o que inclui integralmente os gastos com planos médico-hospitalares e odontológicos, inclusive aqueles pagos pelos empregadores. No mesmo ano, as famílias responderam por 73,3% do gasto total com medicamentos no País.
É importante perceber que no período analisado houve aumento tanto dos preços quanto do volume de utilização de bens e serviços de saúde, ainda que o levantamento indique uma desaceleração no ritmo em que os preços e a utilização desses serviços progrediu a partir de 2014, com o início da recessão econômica. O único ponto realmente “fora da curva” foi a utilização dos serviços de saúde em 2016, que recuou 1,5% em relação ao ano anterior. O movimento pode ser notado no gráfico abaixo e reforça nossa percepção de que os gastos com saúde são os que as pessoas mais se esforçam para não cortar em momentos de crise e o primeiro a ser retomado quando a situação econômica começa dar sinais de melhora.
De modo geral, o relatório de Conta Satélite de Saúde reforça algo que costumamos apontar, a grande importância do sistema de saúde na economia brasileira. Além disso, olhando os números da publicação ou os levantamentos mais recentes que temos divulgado, fica claro que o setor tem enfrentado o desafio de conviver com aumento dos custos ao longo dos anos (em função de incorporação de tecnologia, envelhecimento populacional, desperdícios relacionados ao modelo de remuneração etc.). O que causa grande impacto no governo, nas famílias e entidades. Apenas entre 2010 e 2017, a variação dos custos médico-hospitalares aferida pelo VCMH/IESS acelerou de 7,6% para 16,5%.
Para desacelerar este avanço dos custos e garantir que as despesas com saúde não se tornem um peso insuportável para as famílias e empresas, é cada vez mais necessário repensar políticas de saúde adequadas tanto para o sistema público quanto privado. Não o fazer, pode vir a comprometer a sustentabilidade financeira do setor e, consequentemente, afetar negativamente toda a economia do País.
Como temos apontado, o Brasil está envelhecendo e esta mudança demográfica deve gerar uma série de alterações na sociedade e no setor de saúde. Para ajudar os gestores do setor a se preparar para essa nova realidade, atualizamos anualmente a “Projeção das despesas assistenciais da saúde suplementar”, já analisada aqui no Blog.
Além disso, sempre buscamos referências internacionais nas quais embasar nossas pesquisas e dar subsídios para que o setor projete cenários mais realistas. O que, acreditamos, ajuda fomentar conhecimento em prol da sustentabilidade da saúde suplementar.
Neste sentido, um estudo que pode dar pistas valiosas sobre o comportamento dos gastos com saúde frente ao envelhecimento da população é “Estimating the future health and aged care expenditure in Australia with changes in morbidity, apresentado na última edição do Boletim Científico com o título “Estimando o gasto futuro com saúde e cuidados com idosos na Austrália com mudanças na morbidade”.
De acordo com o estudo, a percepção de que o envelhecimento da população aumentará o custo dos serviços de saúde desafiando sua sustentabilidade, especialmente frente às mudanças nos padrões de morbidade, é justificável. Para chegar a essa conclusão, o trabalho estimou o efeito do envelhecimento na saúde total (público e privado) e no gasto com cuidados aos idosos na Austrália entre 2015 e 2035, utilizando um modelo de projeção demográfica simples para o número de pessoas em grupos etários mais velhos, juntamente com uma estimativa baseada nas necessidades de mudanças no custo público e privado do cuidado por pessoa em cada grupo ajustado para mudanças esperadas na morbidade.
O resultado foi um crescimento esperado de 3,33% ao ano nas despesas com saúde, que devem saltar de US$ 166 bilhões para US$ 320 bilhões. Um aumento de quase 100% no período. Ainda de acordo com o estudo, o gasto com saúde por pessoa idosa deve avançar de US$ 7,4 mil, em 2015, para US$ 9,6 mil em 2035.
Apesar do resultado, os autores do trabalho apontam que o envelhecimento terá um efeito menor do que outros fatores, como o equilíbrio – ou a falta dele – na relação entre oferta e demanda dos serviços de saúde.
Os gastos privados com saúde somaram R$ 314,6 bilhões, o que representa 57,6% do total de R$ 546,1 bilhões gastos com saúde no País em 2015. Os números integram o estudo “O Setor de Saúde na Perspectiva Macroeconômica – Período 2010/2015”, realizado com base nos números da Conta-Satélite de Saúde Brasil, recém-publicado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Segundo o estudo, países com modelo de saúde universal tendem a ter gastos públicos superiores aos privados. A lista de exemplos é ampla. Começando no Reino Unido, onde os gastos públicos representam 80% do total, além da França (79%), Itália (75%), Canadá (74%) e Espanha (71%). Países que não apresentam um sistema universal, mas possuem um sistema de saúde público de saúde parcial apresentam, também, um investimento do governo maior que no Brasil, como: África do Sul (56%), Argentina (72%) e Chile (61%).
Os números de investimento público no setor ajudam a entender resultados como o da pesquisa IESS/Ibope, que aponta que em 2015, mesmo ano analisado no novo estudo, o plano de saúde se tornou o terceiro bem mais desejado pelo brasileiro.
Entre 2010 e 2015, o estudo deixa claro que houve um avanço expressivo tanto dos gastos públicos quanto privados. No público, os gastos saltaram de R$ 139,7 bilhões para R$ 231,5 bilhões. Alta de 65,7%. Já no privado, os gastos avançaram de R$ 169,7 bilhões para R$ 314,6 bilhões – sendo R$ 120 bilhões apenas de despesas assistenciais dos planos de saúde com seus beneficiários. Variação de 85,4%. Ainda segundo o estudo, do total de gastos privados, 66,6% foram destinados à saúde privada (planos de saúde e despesas pagas do próprio bolso) e 30,1%, a medicamentos.
O aumento dos gastos também resultou em ampliação do mercado de trabalho. No período analisado, o setor de saúde privada foi responsável pela geração de 1,3 milhão de postos de trabalho com carteira assinada. No total, o segmento passou a responder por 6,6 milhões de empregos formais em 2015, ante 5,3 milhões em 2010. Um avanço de 25,4%, bastante superior ao incremento de 2,7% no total de postos de trabalho registrado no restante da economia ao longo do período analisado.
Apesar das diferenças entre os gastos públicos e privados, é importante notar que os investimentos no setor de saúde apresentaram uma taxa de crescimento médio real de 14,5% ao ano entre 2010 a 2015, enquanto a economia brasileira apresentou uma queda de 18,6%.
Confira o estudo “O Setor de Saúde na Perspectiva Macroeconômica – Período 2010/2015” na íntegra.
Conforme divulgado hoje na coluna Mercado Aberto, assinada por Maria Cristina Frias na Folha de S. Paulo, o gasto de planos de saúde com consultas, exames e procedimentos deverá chegar a R$ 170 bilhões em 2018, 8,7% a mais que no ano passado. Os dados são da Associação Brasileira de Planos de Saúde (ABRAMGE).
Segundo Marcos Novais, economista da entidade, a marca de R$ 150 bilhões foi atingida em 19 de novembro, 27 dias antes do registrado em 2017. Conforme alertamos periodicamente, o avanço nos custos da saúde suplementar do Brasil se dá sob um grande volume de falhas de mercado, como de assimetria de informações na cadeia que compromete comparações e concorrência e não confere clareza nos critérios de formação de preços de insumos como materiais e medicamentos. A adoção de novas tecnologias sem a exigência de estudos de custo-efetividade e análise do sistema em absorver esse incremento de despesas é outro fator de pressão de custos.
“Múltiplos fatores contribuem para essa alta nos gastos. Há um efeito da incorporação de novas tecnologias, dos desperdícios, das fraudes e da expansão da rede”, apontou Novais. “O setor não tem ferramentas para inverter essa tendência de crescimento ainda, então, a evolução dos custos deverá ser mais acelerada no ano que vem”, conclui.
Vale lembrar que recentemente divulgamos a atualização do Índice de Variação do Custo Médico-Hospitalar (VCMH) que registrou alta de 16,9% nos 12 meses encerrados em março de 2018. como tem ocorrido nos últimos anos e ao longo da série histórica do índice, o crescimento foi muito superior à oscilação da inflação geral do País, medida pelo IPCA, que registrou aumento de 2,7% no mesmo período.
Outro ponto importante decorre do fato de o Brasil passar por um processo de transição demográfica, com a maior participação de idosos no total da população, o que impacta diretamente na demanda de serviços de saúde, em especial de internações. A faixa etária de idosos é a que mais cresce no mercado brasileiro de saúde suplementar.
Confira a coluna Mercado Aberto na íntegra aqui.
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) está com uma campanha alertando para os riscos da exposição excessiva de crianças e adolescentes a exames de diagnóstico por imagem, como tomografias computadorizadas e raios x, como mostra reportagem da revista IstoÉ.
Claro, esses exames são extremamente úteis à prática médica e essenciais para diversos diagnósticos. Contudo, também é um fato que muitos dos exames de imagem emitem radiação nociva à saúde do paciente. Assim, pensando na qualidade assistencial, é fundamental que esses exames só sejam solicitados quando absolutamente necessários. Além disso, é preciso racionalidade na hora de determinar que exame realizar. Muitas vezes, um raio x pode solucionar a questão, sem a necessidade de exames complementares. Em outros casos, por exemplo quando a tomografia é fundamental, não há necessidade de se fazer também um raio x . Ou seja, é preciso racionalidade.
Apesar de a principal preocupação com o uso exagerado desses exames se dar pela questão da saúde do paciente, é fundamental que consideremos também o custo desses procedimentos. Além de representar um risco desnecessário, exames que não são essenciais para o diagnóstico determinam custos financeiros para as operadoras, para o SUS e também para o paciente que opta por arcar com as despesas médicas do próprio bolso. Recursos que poderiam ser melhores aplicados em tratamentos e exames realmente necessários.
Ainda falando de custos, há que se considerar os valores de obtenção e manutenção desses equipamentos. Afinal, se eles estão sendo utilizados além do necessário, certamente irão gerar gastos adicionais para laboratório e hospitais, elevando os custos médico-hospitalares.
No mesmo sentido, é possível questionar se a quantidade de equipamentos adquirida e mantida para atender uma quantidade de exames maior do que a ideal não representa outro custo desnecessário para o setor (tanto público quanto privado). A resposta, certamente, é sim. No TD 51 – “PIB estadual e Saúde: riqueza regional relacionada à disponibilidade de equipamentos e serviços de saúde para setor da saúde suplementar” – há mais de 1,7 mamógrafo para cada grupo de 100 mil pessoas em ao menos 10 estados brasileiros, quando a recomendação do Ministério da Saúde é de 0,42 mamógrafo para cada 100 mil pessoas. Apenas para comparação, o Reino Unido conta com 0,88 mamógrafo por 100 mil pessoas.
Por fim, há a questão do pessoal qualificado que é alocado para operar esses equipamentos de diagnóstico e avaliar uma quantidade de exames maior do que seria necessário ao invés de atender pacientes que realmente precisam de atenção. Mais um impacto financeiro e, pior, na qualidade assistencial.
Aproveitando que estamos no Outubro Rosa, vale lembrar que é a mamografia, apesar de ser o único método eficaz de confirmação do câncer de mama, também oferece riscos para as mulheres e não deve ser usado de maneira imprudente. Isso porque, assim como ocorre com diversos exames de imagem, a radiação do mamógrafo pode aumentar a chance de desenvolvimento de doenças, como aponta o estudo vencedor do V Prêmio IESS de Produção Científica em Saúde Suplementar na categoria Promoção da Saúde e Qualidade de Vida, “Análise da Utilização de Mamografia e seus Desdobramentos em um Plano de Autogestão de Saúde” (http://iess.org.br/cms/rep/2015versocompletaparaiess_2pkmxfyf.pdf), de Marcia Rodrigues Braga (já abordado aqui no Blog). Um risco que muitas mulheres ainda desconhecem e que, infelizmente, muitos médicos esquecem de informar. Para saber mais sobre o assunto, vale ler nosso post sobre “Saúde da mulher no Brasil”.