Por diversas vezes já falamos da necessidade de mudar o modelo de pagamento do fee-for-service (FFS), que privilegia a quantidade de atendimentos, para outro que considere questões como qualidade, eficiência e o melhor desfecho clínico, como o DRG. Mas o que, afinal, é o DRG e como ele funciona?
Ao longo desta semana iremos responder essas e outras questões em uma série de cinco posts. Contaremos tudo sobre “DRG e outros modelos de pagamento”, o tema vencedor da nossa última enquete, com base nos dados apresentados no TD 64 – Fatores associados ao nível de gasto com saúde: a importância do modelo de pagamento hospitalar –, que anunciamos, aqui no Blog, na última quarta-feira (26/7).
O DRG, ao contrário do FFS, é um modelo de pagamento prospectivo. Ou seja, o valor para o tratamento de cada grupo de diagnóstico, com seus agravantes e atenuantes, ou serviço é estabelecido previamente a partir de um sistema de classificação que agrupa os procedimentos de acordo com os dados de internações hospitalares coletados (principalmente sobre o paciente, tratamento e características do prestador) em grupos (DRGs) clinicamente significativos.
Assim, por exemplo, é possível determinar que o tratamento de todo paciente do sexo masculino com idade entre 40 e 50 anos, que deu entrada no hospital por conta de um AVC (Acidente Vascular Cerebral) custará R$ 3.000,00 e levará de 2 a 3 dias (Os valores e o tempo de tratamento são fictícios, apenas para ilustrar o exemplo). Se o hospital conseguir tratar o paciente gastando R$ 2.000,00, terá lucro. Se gastou R$ 4.000, terá prejuízo. Se gastar menos, para ter lucro, mas o paciente tiver uma recaída, o hospital não receberá um novo pagamento. Reentradas não são remuneradas! Assim, se estimula a efetividade do hospital e dos prestadores de serviço ao mesmo tempo em que se acaba com desperdícios como os que temos hoje, com excesso de exames e materiais em toda conta de internação sem que resulte em benefícios para a saúde do paciente. Claro, há fatores que podem alterar a classificação de um paciente. No caso acima, por exemplo, um paciente fumante com sobrepeso e diabetes, ou outras comorbidades, exigiria mais cuidados do que outro que costuma ter hábitos de vida mais saudáveis. Ou, ainda, um paciente que, por conta do AVC, caiu e quebrou uma perna exige mais cuidados do que um que sofreu o AVC enquanto estava sentado no sofá e não teve outras complicações.
A ideia do DRG é proporcionar uma medida concisa da atividade hospitalar e, consequentemente, facilitar a comparação dos custos hospitalares e da qualidade e eficiência dos tratamentos, contribuindo para uma maior transparência nos hospitais.
Além do pagamento por DRG, alguns países já trabalham com alocação orçamentária baseada em DRG, principalmente para hospitais públicos, disponibilizando recursos com base na quantidade e tipo de DRG que se espera que o hospital atenda por ano ou na média de atendimento dos anos anteriores.
Claro, há outros modelos de pagamento prospectivo além do DRG e, também, modelos que evoluíram a partir dele, considerando os grupos de procedimentos desde modelo para determinar o pagamento de serviços de saúde, como o Bundle Payment. Mas isso já é assunto para o post de amanhã.
Enquanto aqui, no Brasil, ainda estamos debatendo a adoção de modelos de pagamento de prestadores de serviços por performance (P4P) e a necessidade de definir e divulgar indicadores de performance para aferir a qualidade dos prestadores de serviço, como já debatemos aqui no Blog, em outros países esse debate está em outro patamar.
Na Dinamarca, por exemplo, há estudos aferindo qual o nível organizacional para os incentivos de performance em hospitais. É o caso, por exemplo, do estudo “Who to pay for performance? The choice of organizational level for hospital performance incentives” (Quem pagar por performance? A escolha do nível organizacional para os incentivos de performance em hospitais, em tradução livre), destaque do último Boletim Científico do IESS.
O estudo analisou o desempenho de hospitais que realizam pagamentos considerando o desempenho individual de cada departamento e do hospital como um todo. Os resultados apontam que hospitais que adotam incentivos financeiros diretos aos departamentos específicos, considerando as performances isoladas, apresentam desempenho, em média, 5% superior ao de hospitais que não distribuem o pagamento pela performance de forma individualizada entre seus departamentos.
Os autores da análise ainda apontam que essa diferença de desempenho se deve, principalmente, ao “efeito carona”, que se caracteriza por um departamento se esforçar menos do que outro, já que a remuneração não é individualizada. Apesar de estarmos mais de uma década atrasados em relação a Dinamarca, onde os hospitais são obrigados a divulgar indicadores de qualidade desde 2004, certamente é um modelo a se ter em mente nos debates que estamos travando por aqui.
O índice de Variação do Custo Médico Hospitalar do IESS (VCMH/IESS) expressa a variação do custo das operadoras de planos de saúde com internações, consultas, terapias e exames entre dois períodos consecutivos de 12 meses. Contudo, diferentemente do IPCA e do IPCA Saúde, o VCMH não é calculado apenas com base na variação de preços, mas considera, também, a frequência com que um serviço é utilizado.
Mas o que isso significa? Para indicadores que registram o aumento dos preços de uma determinada cesta de produtos e serviços, se o preço médio das consultas aumentar de R$ 100 para R$ 110, houve variação de 10%. Para o VCMH é importante constatar também quantas consultas foram realizadas no período. Assim, mantendo a variação de preço do modelo acima e considerando que eram realizadas 1000 consultas e passaram a ser realizadas 1100 consultas, o VCMH registraria um avanço de 21%.
Por isso, tanto no Brasil quanto nos demais países que utilizam indicadores com metodologia semelhante, constata-se que o VCMH é sempre superior ao índice de inflação geral, como pode ser constatado no TD 52 “Variação dos custos médicos hospitalares e inflação geral - por que esses índices não são comparáveis no brasil e no mundo?”. Esse descolamento é justificado, principalmente, em virtude da incorporação de novas tecnologias e do processo natural de envelhecimento da sociedade, fatores que aumentam tanto a frequência de utilização quanto o preço dos serviços e, consequentemente, fazem os custos em saúde crescer em ritmo superior ao da inflação geral.
Metodologia do índice VCMH/IESS
A metodologia do índice VCMH/IESS é reconhecida internacionalmente e aplicada na construção de índices de variação de custo em saúde como o S&P Healthcare Economic Composite e Milliman Medical Index. Além disso, o índice considera uma ponderação por padrão de plano (básico, intermediário, superior e executivo), o que possibilita a mensuração mais exata da variação do custo médico hospitalar. Ou seja, se as vendas de um determinado padrão de plano crescerem muito mais o que as de outro padrão, isso pode resultar, no cálculo agregado, em VCMH maior ou menor do que o real, o que subestimaria ou superestimaria a VCMH. A amostra utilizada para o cálculo do índice VCMH representa aproximadamente 10% do total de beneficiários de planos individuais (antigos e novos) distribuídos em todas as regiões do país.
Série histórica
A série histórica completa do VCMH/IESS está disponível aqui, mas para consultas específicas, o melhor é utilizar o IESSdata.
A produtividade hospitalar brasileira é menor que a americana e afeta negativamente os tratamentos clínicos. Esta é a conclusão do trabalho “Avaliação da Produtividade de Hospitais Brasileiros pela Metodologia do Diagnosis Related Groups”, produzido por José Carlos Serufo Filho, vencedor da categoria ”Economia” do V Prêmio IESS de Produção Científica em Saúde Suplementar, realizado em 2015.
O Estudo avalia a produtividade dos hospitais pela metodologia do Diagnosis Related Groups (DRG – Grupos de Diagnostico Relacionados, em tradução livre do inglês). O assunto é constante foco de estudos do IESS e já foi mencionado aqui no Blog também.
De acordo com o estudo vencedor, a produtividade brasileira em tratamentos clínicos chega a ser 86,3% menos eficaz que a norte-americana. As causas da baixa produtividade apontadas podem ser explicadas apenas parcialmente pela complexidade determinada por variáveis biológicas. Foram analisados mais de 145 mil relatórios de altas de cerca de 120 hospitais usando a categorização DRG do governo norte-americano em sua versão 31.0 (MS-DRG).
O Prêmio IESS é a mais importante premiação de trabalhos acadêmicos com foco em Saúde Suplementar no Brasil. Se você também tem um trabalho de conclusão de curso de pós-graduação (especialização, MBA, mestrado ou doutorado) relacionado à Saúde Suplementar nas áreas de Economia, Direito e Promoção de Saúde e Qualidade de Vida, inscreva-se, gratuitamente, até 15 de setembro. Veja o regulamento completo.
Os dois melhores trabalhos de cada categoria receberão prêmios de R$ 10 mil e R$ 5 mil, respectivamente, além de certificados, que serão entregues em cerimônia de premiação em dezembro.